Pais de bebé retirado em Inglaterra estão em Portugal para sensibilizar autoridades
Advogado português diz que vinda do casal a Lisboa, enquanto o processo corre e o filho está institucionalizado em Inglaterra, “não será prejudicial”.
Os pais do bebé que lhes foi retirado com nove dias de vida em Inglaterraestão em Portugal para sensibilizar a opinião pública e as autoridades portuguesas a intervirem junto das autoridades inglesas. Iolanda Menino, portuguesa de 31 anos a viver em Inglaterra há cinco, e Leonardo Edwards, inglês, organizaram uma vigília em Lisboa frente à embaixada britânica, onde entregaram uma carta. Sob chuva, na manhã desta sexta-feira, a concentração juntou familiares e amigos — não mais de 15 pessoas —, além de jornalistas.
Na missiva entregue na embaixada, Iolanda qualifica a retirada do seu bebé, nascido a 1 de Fevereiro, de “rapto” pelos Serviços Sociais de Southampton, onde o casal vive. Desde o dia da retirada, a 9 de Fevereiro, não vêem o filho, que foi entregue a uma instituição. E, antes disso, a criança não chegou a ser registada. “Temos 42 dias para registar o nosso filho.” O problema em Inglaterra, argumenta, é que quando uma criança é registada passa a ficar à mercê do Estado, diz Iolanda. “Por isso eles queriam tanto que nós fizéssemos o registo, mas ainda não tínhamos escolhido o nome.”
A portuguesa, que trabalhava como técnica de cardiologia, deixou o emprego para cuidar do filho. Não sabe ao certo quando regressa a Inglaterra. Uma das prioridades em Portugal será apresentar uma queixa na polícia por rapto do bebé, agora com dois meses e meio, mesmo sabendo que as autoridades policiais portuguesas não têm competência para intervir no caso. Diz que não lhes é dada a oportunidade de denunciar a situação em Inglaterra, onde também fizeram uma participação à polícia nesse sentido.
“Um crime ocorreu na nossa casa”
“Queremos denunciar este crime”, diz Iolanda em voz alta frente à embaixada. “Um crime ocorreu na nossa casa”, acrescenta Leonardo, visivelmente ansioso. Deseja relatar cada um dos passos que os dois viveram desde o dia do parto, em casa. “Foi uma opção nossa, queríamos um parto natural, na água”, diz. “E foi muito bonito”, acrescenta. Mas “tudo começou a correr mal com a chegada da parteira”. Iolanda sofreu uma hemorragia e teve de ser conduzida ao hospital de urgência. “A enfermeira parteira não colaborou em nada”, denunciam ambos.
No dia seguinte ao parto, a mãe, que teve de ser operada no hospital, teve alta. Já em casa, no dia 3, uma enfermeira apareceu para ver o bebé. Não se identificou e não lhe abriram a porta. No dia 4, o bebé desenvolveu icterícia. “Mas estava bem”, diz Iolanda. No dia 5, uma médica bateu à porta, sem se identificar, e, “de modo rude”, disse que queria ver o bebé. Nova recusa. “A casa não estava em condições”, depois do parto e da hemorragia que sofreu Iolanda, justifica a própria. Mais tarde, é já um polícia, por ordem do tribunal, que se dirige a casa da família, também para ver o bebé. E aceita vê-lo através da janela, conta Iolanda, que tinha acabado de amamentar e não estaria em condições de o receber em casa.
Ao final da tarde, Iolanda, Leonardo e o filho de ambos vão de táxi para casa de uma amiga, onde às 3h da madrugada são abordados por técnicas dos serviços sociais e agentes da polícia. São conduzidos ao hospital para o bebé ser observado e depois tratado por icterícia. No dia 9, depois de uma audiência em tribunal, o bebé é retirado aos pais. Uma nova audiência em tribunal, perante um juiz do Tribunal de Família e Menores, está marcada para dia 10 de Maio, e aí poderá ser decidido o destino da criança. Ou não.
Desconfiados relativamente a tudo
Para já, os avós maternos em Portugal disponibilizaram-se para acolher o menor. Já foram contactados pelo tribunal, mas esse pode ser um processo moroso com a Segurança Social em Portugal a ter de se envolver para avaliar se os avós têm condições de receber a criança.
A mãe não aceita os advogados do Estado e não se disponibilizou para ser submetida a testes psicológicos. “Ela está com medo que manipulem os testes” contra si, diz o advogado Pedro Proença, especialista em Direito da Família, que se prontificou a apoiar o casal em Portugal, pondo-os em contacto com um advogado reconhecido nesta área, mas que o casal também recusou. “Estão desconfiados relativamente a tudo o que vem do sistema judicial inglês. E estão a encarar de frente uma justiça de menores quase secreta, que tem sido muito adversa para os pais [em situações destas] nos últimos anos. E eu temo que vão ter o sistema todo contra eles. Estão a fazer tudo aquilo que os meus colegas ingleses dizem ser prejudicial nestes casos.”
Iolanda e Leonardo foram intimados pela polícia a não falar com órgãos de comunicação social ou divulgar as circunstâncias em que a criança foi retirada. Recusam a ordem de silêncio e criaram uma página no Facebook a contar a situação. A Câmara de Southampton, a que pertencem os serviços sociais, já pediu ao tribunal para aplicar uma pena suspensa por desobediência, diz Pedro Proença.
O advogado considera, no entanto, que a vinda do casal a Portugal “não será prejudicial”. E explica: “A criança não está juridicamente à guarda dos pais. E eles vieram cá para sensibilizar a opinião pública e as autoridades para este caso. E vão regressar.”
acordeiro@publico.pt